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Criado por PROPP em sex, 27/03/2020 - 13:51 | Editado por PROPP há 4 anos.
Uma equipe transdisciplinar de pesquisadores mostra como o controle do movimento das pessoas entre cidades poderia frear o avanço da doença no Brasil e identificam uma grande vulnerabilidade da região Amazônica
Um grupo interdisciplinar de cientistas do Brasil e do México, composto por virologistas, geneticistas, microbiologistas, físicos e ecologistas, abordou o problema da disseminação da pandemia de coronavírus em todo o território brasileiro. Este grupo acaba de concluir um modelo matemático que descreve a dinâmica da disseminação do SARS-CoV-2 através da rede de transporte aéreo. O modelo gera algumas previsões alarmantes para a transmissão no Brasil, mas aponta para possíveis soluções, se forem implementados nos aeroportos um protocolo severo de vigilância de entrada, e o monitoramento das pessoas que chegam de regiões de risco (agora nacionais e internacionais. A implementação de tais protocolos nos principais aeroportos, se feita agora, pode proteger eficientemente os povos indígenas na Amazônia. As principais conclusões:
1 - A falta de um rígido controle sanitário aeroportuário tornou o Brasil mais vulnerável do que outros países tropicais em desenvolvimento com uma rede aeroportuária semelhante, mas com um tamanho populacional muito maior, como Índia (Ásia), ou população semelhante, mas com uma rede aeroportuária mais simples, como a Nigéria (África).
2 - A rede aeroportuária brasileira possui forte capilaridade e permite a rápida disseminação de doenças.
3 - O transporte aéreo possui uma forte centralidade nas capitais e grandes cidades do sudeste, o que provocará uma dinâmica exponencial de infecção em várias cidades ao mesmo tempo. O primeiro caso no Brasil foi registrado em 26 de fevereiro e, no modelo, se nada mais for feito, de forma síncrona, a maioria das grandes cidades do leste e do sul poderá estar amplamente infectada por volta do dia 50 e tornar-se contaminante das demais cidades, conectadas pela complexa rede de aeroportos. Esse padrão causaria o colapso dos serviços de saúde nas cidades que possuem os hospitais mais bem equipados.
4 - Consequentemente, a estrutura da rede aérea causaria duas ondas de contaminação, com uma rápida disseminação da doença no país entre os dias 65 e 80 após o primeiro caso (o que seria entre os dias 01 de abril e 16 de maio). A primeira onda se daria pelo grande aumento diário da doença após 50 dias, como já descrito, para as cidades mais densamente conectadas (e que recebem a maioria dos voos internacionais) por volta de 16 de abril. A segunda onda se dará após 90 dias (26 de maio), para as cidades mais periféricas, incluindo toda a Amazônia e região Centro-Oeste. O fato dessas regiões serem atingidas em uma segunda onda é a boa notícia, pois há mais tempo de organizar uma resposta sanitária para estas que também são as regiões mais vulneráveis do ponto de vista de saúde pública.
5 - Especificamente para a Amazônia, a cidade de Manaus é um “clustering” regional da rede, capaz de espalhar o Coronavírus pelas partes mais remotas da região amazônica, expondo, em pouco tempo, uma quantidade considerável de populações indígenas. O COVID-19 pode ser ainda mais devastador para esses grupos étnicos, que geralmente tem maior suscetibilidade a doenças não-nativas. Da mesma forma, cidades e vilas remotas também são as mais expostas a serviços públicos de saúde precários. Muitas lideranças e organizações indígenas já estão reivindicando ações específicas para protegê-las. Uma vigilância severa e acompanhamento nos dois aeroportos de Manaus são um bom começo! A mensagem é que ainda há tempo para reverter essa situação de vulnerabilidade à SARS-Cov-2 no Brasil, pelo menos para as populações das regiões mais remotas do país.
O estudo:
“Severe airport sanitarian control could slow down the spreading of COVID-19 pandemics in Brazil”. Preprint no Biorxiv. https://doi.org/ BIORXIV/2020/005652
Os pesquisadores:
Sérvio Pontes Ribeiro - Núcleo de Pesquisas em Ciências Biológicas, Universidade Federal de Ouro Preto
Wesley Dáttilo - Red de Ecoetología, Instituto de Ecología AC (México)
Alcides Castro e Silva - Laboratório da Ciência da Complexidade, Departamento de Física, Universidade Federal de Ouro Preto
Alexandre Barbosa Reis - Laboratório de Imunopatologia, Departamento de Análises Clínicas, Escola de Farmácia, Universidade Federal de Ouro Preto
Aristóteles Góes- Neto - Laboratório de Biologia Molecular e Computacional de Fungos, Departamento de Microbiologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais
Luiz Carlos Junior Alcantara - Laboratório de Flavivírus, Instituto Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz
Marta Giovanetti - Laboratório de Flavivírus, Instituto Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz
Wendel Coura-Vital - Laboratório de Epidemiologia e Citologia, Departamento de Análises Clínicas, Escola de Farmácia, Universidade Federal de Ouro Preto.
Geraldo Wilson Fernandes - Departamento de Genética, Ecologia & Evolução/ICB, Universidade Federal de Minas Gerais
Vasco Ariston Azevedo - Departamento de Genética, Ecologia & Evolução/ICB, Universidade Federal de Minas Gerais